Movimento Varejo

Qual o impacto da entrega na imagem da loja?

Em entrevista à Varejo SA, Vinicius Pessin, da EuEntrego, explica como o last mile influencia a maneira como o consumidor vai avaliar toda a experiência de compra

Já se perguntou ou mediu de que maneira o delivery dos seus produtos impacta toda a experiência de compra? Não?! Saiba que esta é uma questão extremamente estratégica para o varejo, e o avanço do comércio eletrônico e da digitalização no setor, principalmente após a pandemia de covid-19, apenas acentuou esta necessidade. Uma experiência ruim com o last mile delivery – o último trecho de uma entrega – pode trazer graves prejuízos à imagem da empresa, mesmo que todo o resto tenha dado certo.

O alerta é de Vinicius Pessin, CEO da Eu Entrego, startup de entregas colaborativas. Pessin conversou com a equipe da Varejo SA e deu dicas sobre como os varejistas de pequeno porte podem tirar proveito da “última milha” para fidelizar clientes, se diferenciar da concorrência e, até mesmo, fazer frente a grandes varejistas, entregando em menor tempo.

“Talvez o diferencial para ele (o pequeno varejista) seja conseguir atender bem e mais rápido o entorno dele. De forma que, se fizer um pedido no grande marketplace, será atendido em 48 horas ou 24 horas; mas se pedir por WhatsApp ou no site do varejista do meu bairro, pode ser que em duas horas ou três horas esteja com o problema resolvido. Acaba sendo também uma forma do pequeno se diferenciar nesta disputa tão acirrada”, destaca o CEO da Eu Entrego.

O last mile ou a última milha representa a única parte “visível” do processo logístico. Com isso, não importa como foram as etapas anteriores desde que nesta o pedido seja entregue com a qualidade e no tempo combinado durante a compra. Caso contrário, sete em cada dez consumidores não comprarão da empresa nunca mais, segundo pesquisa realizada pela Forrester & IBM. “Em outras palavras: a percepção do usuário depende quase que exclusivamente da sensação que ele vai experimentar nesta fase”, escreveu o empreendedor recentemente em um artigo.

“A última milha pode ser o momento mágico ou o trágico da experiência, porque não adianta você ter uma experiência de compra, de pagamento e de relacionamento perfeitos, se nesta última fronteira – quando o produto precisa chegar na porta do consumidor com o melhor estado de embalagem e conservação no tempo combinado –, você falhar. Todo o resto da experiência foi por água abaixo”, disse para a Varejo SA. “Então, ficou muito claro que agenda de logística virou protagonista da estratégia de marketing das companhias, muitas delas investindo ou comprando startups de logística e outras internalizando”, acrescentou.

Vinicius Pessin tem uma trajetória de mais de 20 anos em digital, segmento em que atua desde o começo da internet comercial no Brasil, na segunda metade dos anos 90 do século passado.

“A EuEntrego soma dois movimentos que observei com atenção: que a logística seria um dos principais gargalos para o crescimento do e-commerce e do varejo brasileiro; e a economia colaborativa, que utiliza recursos que as pessoas têm para poder resolver algum problema. A EuEntrego usou da economia colaborativa para resolver uma parte do problema de logística, que é a última milha, conectando varejistas a uma rede de entregadores autônomos, que fazem entregas com seus próprios veículos”.

Confira o bate-papo que a equipe da Varejo SA teve com o Vinicius Pessin, da EuEnrego:

Varejo SA – O que é o last mile?
Vinicius Pessin – Na primeira onda do e-commerce, se tinha como estratégia logística os grandes centros de distribuição (CD). Então, independentemente de onde você fazia compra, se estava lá no Norte, no Nordeste ou no extremo sul do país, esses produtos saíam de grandes centros de distribuição, que no primeiro momento estavam em São Paulo. Depois, cada capital estratégica e com volume de vendas começou ganhar os seus centros de distribuição.

Mas o mercado acabou evoluindo, sobretudo para os varejistas que tinham suas redes de loja física, num conceito um pouco lógico mas que demorou um pouquinho para amadurecer, que é: por que um produto sai de tão longe, de um centro de distribuição, para chegar efetivamente na porta do consumidor, levando às vezes semanas no começo desse processo, e com custo alto, uma vez que tinha o transporte interestadual e intermunicipal e, finalmente, a última milha, que é esse último trajeto até a porta do consumidor.

“A última milha pode ser o momento mágico ou o trágico da experiência de compra”, diz Vinicius Pessin
Foto: Divulgação

Se essas redes têm uma grande fortaleza é as próprias lojas físicas. Um dos adventos que fez com que o last mile ou a última milha se tornasse estratégico no negócio do varejo foi o e-commerce começar efetivamente vender o produto que estava mais próximo do consumidor na loja física. Mas, por outro lado, isso acabou gerando uma dificuldade logística, que é: diferente dos centros de distribuição, que tinham todos os seus caminhões próprios ou de transportadoras, com toda a malha logística construída, agora você tem milhares e milhares de pontos de coleta com entrega granularizada, de consumidor a consumidor. Por isso, que o desafio do last mile ou da última milha se transformou na última fronteira da experiência do cliente, como o marketing tem falado.

Varejo SA – Por favor, fale mais um pouco sobre o impacto desta última milha na experiência de consumo? De que maneira impacta positivamente ou negativamente tem toda a experiência de compra?
Vinicius Pessin – A gente diz que a última milha pode ser o momento mágico da experiência ou pode ser um momento trágico da experiência, porque não adianta você ter uma experiência de compra, de pagamento e de relacionamento perfeitos, se nesta última fronteira – quando o produto precisa chegar na porta do consumidor com o melhor estado de embalagem e conservação no tempo combinado –, você falhar. Todo o resto da experiência foi por água abaixo. Então, ficou muito claro que agenda de logística virou protagonista da estratégia de marketing das companhias, muitas delas investindo ou comprando startups de logística e outras internalizando.

A logística está na mesa do marketing, e se transformou nesta última fronteira de experiência. Estamos falando de embalagem, prazo e esta corrida para entregar cada vez mais rápido. Quando começou essa jornada de última milha, a gente falava em next day como um negócio extraordinário, compra em um dia e recebe no outro. Isso ficou ultrapassado. Aí, vem o same day, quer dizer, se eu comprar de manhã, vou receber à tarde; se eu comprar à tarde, eu recebo à noite. Agora, entrega-se em algumas horas.

O que necessariamente acabou acontecendo? Primeiro, você precisa ter muita tecnologia, até para saber, de forma preditiva, qual é o comportamento das entregas em um determinado raio e antecipar a aproximação do entregador, o ponto de coleta etc. E a tecnologia está muito ligada a toda jornada da entrega para conseguir corrigir, eventualmente, até alguma falha em tempo real. Se você percebe, por exemplo, que um carro que tem uma rota de entrega e está atrasado, pode interceptar este carro dividir a carga para você conseguir cumprir os horários.

Varejo SA – Qual é a importância de ter um bom serviço de entrega para o varejo?
Vinicius Pessin – Temos hoje no varejo tradicional um mix entre entre o e-commerce e as lojas físicas, mas cada vez mais, inclusive, no último ano turbinado pela pandemia, o digital se transformou em estratégico, independente da modalidade. O compromisso que você cria com teu consumidor é um momento-chave, e se tiver uma falha nessa experiência, é provável que o cliente não utilize mais aquele canal.

Uma coisa que a gente trabalha muito com os nossos parceiros varejistas é: se você vai fazer, vai entrar, vai prometer, esteja preparado para cumprir! É muito difícil depois você conseguir reverter uma experiência ruim. Ao contrário, quando você consegue fazer uma boa experiência, você fideliza o consumidor nesse novo canal, e isso é uma das coisas que a gente percebeu na reabertura gradual do varejo. Um percentual importante do novo consumidor, que experimentou o online forçado pelo lockdown e a pandemia, ficou (nos canais virtuais) mesmo com a reabertura, porque a experiência foi excelente ou muito boa.

Varejo SA – O serviço de entrega veio para ficar no varejo físico?
Vinicius Pessin – A entrega se tornou uma fortaleza para o varejo. Há cinco anos, na NRF (evento da National Retail Federation), se dizia que a loja física ia acabar. Agora, quando se fala de NRF, é a loja física como protagonista, seja como pickup store, seja como showroom seja como uma fortaleza logística. Isso porque leva o produto para mais próximo do consumidor final e é o único jeito de ter uma entrega rápida. Se você está em Salvador e faz uma compra, o produto vai sair da loja física mais próxima do consumidor em Salvador, e não mais de Jundiaí. Depois, vem os conceitos de dark store, dos mini hubs, mini CDs, que é para cada vez mais empurrar os produtos para mais próximo do consumidor final.

Varejo SA – Como o pequeno varejista pode aproveitar esta proximidade com o cliente final a seu favor?
Vinicius Pessin – Para sua geografia ou para o raio de quilometragem próximo à loja física, o pequeno varejista pode utilizar os mesmos conceitos, e hoje tem ferramental acessível para ele, inclusive. Mas quando a gente fala de vender em território nacional, neste continente que é o Brasil, aí um dos caminhos é o de operar com marketplace, usar não só estrutura de venda desses grandes players de marketplace, mas também a estrutura de fulfillment de logística. Claro, para isso, é preciso investimento, porque vai ter que deslocar o teu estoque para dentro das estruturas do marketplace, para que eles operem, e este custo de operação precisa compor com as margens deste pequeno Varejista.

Na prática, o pequeno varejista vai estar sempre mais fragilizado nesta venda online em nível nacional. Talvez o diferencial para ele seja conseguir atender bem e mais rápido o entorno dele. De forma que, se fizer um pedido no grande marketplace, serei atendido em 48 horas ou 24 horas; mas se pedir por WhatsApp ou no site do varejista do meu bairro, pode ser que em duas horas ou três horas esteja com o problema resolvido. Acaba sendo também uma forma do pequeno se diferenciar nesta disputa tão acirrada.

Varejo SA – Falando do pequeno varejista, que cuidados deve ter na hora de montar esse serviço de entrega?
Vinicius Pessin – O importante é, como tudo, se planejar e se preparar. Nestes últimos tempos de pandemia, quem estava mais preparado e já tinha uma agenda para o delivery, sofreu menos o impacto (do novo normal). Então, é começar pequeno e se preparar para cumprir o combinado. Do ponto de vista de logística, é preciso definir quanto eu planejo vender; e com esta venda, qual a estrutura que eu preciso para cumprir o prazo. E aqui, é preciso avaliar se realmente precisa entregar tudo em 2 horas ou 3 horas ou no mesmo dia. Para alguns segmentos, sim. Já outros, é preciso pensar: ‘se eu organizar e o que vendo em um dia, eu entrego no outro, isso vai me dar mais tempo para separar as mercadorias, consolidar as cargas e fazer entrega eventualmente com um único carro?’. Tudo isso acaba tornando a entrega com um custo mais adequado.

Também posso dar a alternativa, para o meu consumidor, de uma entrega mais expressa, que vai custar um pouco mais e exigirá um processo mais organizado, mas terá uma remuneração por esta urgência. Este é, aliás, um aprendizado que o próprio e-commerce teve ao longo desses últimos anos, que é a questão do frete grátis e a entrega rápida. A gente vê hoje, tanto em experiências fora do país, quanto no Brasil, que não tem almoço grátis. Você até pode por algum tempo subsidiar um frete, mas alguém vai ter que pagar isso, seja o consumidor, seja o varejista. Então, o empreendedor deve mostrar que quanto mais rápida for a entrega, necessariamente o custo vai ser maior.

Neste caso, a experiência do menu de frete é boa. Se você for comprar na Amazon nos Estados Unidos, se quiser o produto agora, então ele vai custar X dólares de frete; se quiser em 48 horas, vai custar X menos dólares; se em sete dias, a entrega sai de graça. Ou então, vendem a assinatura do Prime, e o frete é grátis sempre. Claro que não é grátis, o cliente está pagando uma mensalidade que faz um bolo e gera o frete grátis.

O mais importante é se planejar, começar pequeno e ir testando. Não se afobar para fazer o ‘frete grátis’ muito rápido, porque em um determinado momento, sobretudo se for um varejista menor, vai fazer a conta e perceber que está perdendo dinheiro, e aí obviamente nenhum negócio persiste em uma estrutura assim.

Varejo SA – Para a entrega funcionar bem no pequeno varejo, o que é melhor: contratar prestadores de serviço, fechar parcerias com empresas especializadas ou ter a própria equipe de entregadores?
Vinicius Pessin – Dificilmente um varejista vai conseguir ser é bom em tudo: na logística, no estoque, no fluxo de caixa etc. Então, o que nos propomos na EuEntrego é ser a melhor solução tecnológica para logística de última milha. Necessariamente, precisamos ser melhores que a alternativa de se construir isso dentro de casa.

E o que seria isso? Contratar desenvolvedores para fazer um aplicativo/plataforma, ter um time de operação para gerenciar motoristas autônomos, ter monitoramento em tempo real para não só acompanhar qualquer alteração mas para ter todo o nível de comprovação de geolocalização, de assinatura digital e de foto da portaria da residência onde o produto foi entregue, para acareações em caso de problemas. É um tema muito complexo para você ser bom no que vende, no gerenciamento da loja e em fazer marketing. Então, deixa isso que a gente resolve, pois somos especialistas.

Agora, com a complexidade do novo varejo, não há uma única solução para resolver todos os problemas. No varejo omnichannel, com tantas nuances de logística, é difícil você ter uma solução única. Grandes varejistas terão um mix: estrutura e frota próprias e frota terceirizada com transportadoras e aplicativos de cloud source, como o nosso. E tudo isso requer tecnologia, justamente, para poder gerenciar a demanda de entrega e identificar a melhor solução.

Então, hoje eu diria que a palavra-chave da logística para o varejo é a orquestração, é conseguir realmente ser um maestro que toma todas estas possibilidades para dar a melhor experiência possível para o consumidor final. Dificilmente, vai ser uma única solução.

Varejo SA – De que maneira os conceitos crowdshipping e o ship from store se relacionam com o last mile delivery?
Vinicius Pessin – O crowdshipping, como o próprio nome já diz, é uma multidão fazendo entregas, e é exatamente o que a EuEntrego faz: pessoas comuns cadastradas na nossa plataforma, espalhadas nos 27 estados do Brasil e dispostas a fazer entregas para varejistas. Quando a gente vai para o varejista de porte médio e pequeno, diria que não faz nenhum sentido fazer investimento em frota e contratar motorista, quando pode ter um serviço que é sob demanda. Então, se tem venda, pode chamar os entregadores; e se não tem venda, não chama e não fica com este custo fixo carregado na estrutura.

O ship from store, para mim, estava caindo de maduro e a pandemia deu o último empurrão que precisava. É uma fortaleza muito grande você ter um produto tão perto do consumidor e ele poder acessar esse produto online. Tudo bem que o ganho de escala dos centros de distribuição é importante, mas à medida que o prazo de entrega se torna estratégico para o negócio, não vai conseguir dar um prazo tão rápido saindo de um CD. Em contrapartida, se no raio que o consumidor está, você tem uma loja, uma dark store, um mini hub, vai conseguir operar de maneira mais rápida.

O pequeno pode se diferenciar no raio de atuação dele. Pode se propor da seguinte forma: neste raio aqui de 2/3 km da minha loja, ninguém vai conseguir fazer uma entrega tão rápida e tão assertiva quanto a minha. Acho que essa é uma possibilidade dele se diferenciar em meio a toda essa disputa.

Para mim, crowdshipping e ship from store vão, cada vez mais, representar uma fatia importante das vendas do varejo. Na China, hoje, praticamente é o principal modal, e por isso que lá em 20/25 minutos é possível ter qualquer produto na sua mão, baseado numa tecnologia muito forte e uma rede de entregadores autônomos. Nos Estados Unidos, a Amazon lançou o Amazon Flex, que é exatamente um crowdshipping. Em um país que tem uma logística muitíssimo maior e mais estruturada do que a nossa, não se está abrindo mão desse modelo alternativo de entrega.

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