Como levar o cliente do sofá para a sua loja?
Uma reflexão sobre a influência do comércio eletrônico no varejo físico sob a ótica do consumidor
O consumidor atual já não sai de casa apenas para comprar. Ele sai em busca de uma experiência que faça sentido. Quer se sentir bem no ambiente, encontrar conveniência, praticidade e, acima de tudo, ser respeitado em algo que se tornou o bem mais precioso de todos: o seu tempo. Isso não faz parte de um planejamento racional e programado. Ninguém sai de casa dizendo: quero me sentir bem! Isso acontece de forma inconsciente e por isso perceber essa busca é imprescindível para mudar o resultado do seu negócio.
O smartphone transformou o sofá em concorrente direto do varejo físico, imagine colocar milhões de lojas, shoppings e vendedores na palma da mão do consumidor, consegue imaginar? Com um simples clique, umas poucas mexidas de dedo, qualquer produto chega em minutos, horas e poucos dias, na porta de casa. Isso coloca em xeque cada visita do cliente ao ponto de venda. Por que ele trocaria o conforto da tela por filas, burocracia ou ambientes que não oferecem nada além do óbvio?
O consumidor tem pressa. Essa pressa não é apenas de rapidez, mas de significado. Não se trata de acelerar processos sem fundamento, sem razão ou de forma mecânica. O cliente decide baseado em memórias, na maioria das vezes, trabalhadas no inconsciente. Uma experiência ruim marca mais do que dez experiências boas, e isso fixa de um jeito desproporcional na mente do consumidor. Basta uma fila sem sentido, um atendimento frio ou um espaço desorganizado para que a memória negativa se torne guia da próxima decisão, impactando diretamente todo o processo de compra. Se a lembrança da sua loja for ruim, o consumidor não volta, e muitas vezes ele não vai saber responder o porquê disso, porque esse processo não é feito de forma consciente, mas através de sentimentos, impressões…
Ao analisar o varejo americano, como descrevi no livro: Vivendo o Varejo Americano, o que chama a atenção não são apenas as tecnologias, mas a obsessão em cuidar do tempo do cliente. Self-checkout, multicanalidade de pagamentos e compras, mix adequado ao perfil local, layout que facilita escolhas rápidas. Quando se fala em mix local de produtos, pode-se afirmar que um
mix atraente para o cliente é aquele que conversa com o cliente, que consegue se conectar com os desejos e necessidades, aproximando a procura com o encontrar. Servindo de ponte para realização e consolidação do bem-estar do indivíduo no seu estabelecimento.
Tudo gira em torno de reduzir atritos e permitir que o consumidor se sinta livre para escolher, para ser e para aproveitar. Essa conexão do cliente com o ambiente é mais significativa quando ele participa ativamente. Deixar o cliente escolher é dar a ele as ferramentas necessárias para conhecer seu produto e serviço sem atritos ou burocracia.
É nesse ponto que muitos varejistas brasileiros falham. Ainda acreditam que o consumidor entra na loja para comprar produtos. Ele entra para resolver necessidades, para primeiro ser atendido. Se essas necessidades são tratadas apenas como transação, o celular resolve melhor. Mas se são tratadas como experiência, desde o sorriso do atendente até a organização das prateleiras, o ponto de venda se torna insubstituível. Que memórias você está ajudando o seu cliente a criar em cada visita que ele faz na sua loja?
A jornada de compra começa antes do cliente pisar na loja. Começa na memória que ele carrega das experiências passadas. Por isso, limpeza, treinamento e acolhimento não são detalhes, são a base da competitividade. Quem não entende isso perde espaço todos os dias para o digital, para a conveniência e para a facilidade. O que você tem feito para facilitar a vida do seu cliente? Ou seus processos visam apenas facilitar sua contagem de estoque, seu fechamento de caixa, sua segurança?
Nos Estados Unidos, vi lojas de conveniência transformarem o simples ato de abastecer o carro em oportunidade de venda adicional, isso já está tão enraizado na cultura, que qualquer coisa diferente, gera atrito. Quase todos que param para abastecer entram na loja. Isso só acontece porque o ambiente foi desenhado para acolher, oferecer variedade e praticidade. No Brasil, ao contrário, ainda vemos muitos postos que se contentam em vender apenas combustível. O cliente não é o carro, é a pessoa dentro dele.
A pergunta central é: o que o consumidor encontra na sua loja que não encontra no smartphone, deitado no sofá de casa? Essa é a chave. Se a resposta for apenas “produtos”, sua loja já perdeu. Se for experiência, identidade, pertencimento, conveniência e bem-estar, sua loja está viva.
Não é o tamanho do mix ou da loja que determina, mas a forma como você entrega valor. Não é a quantidade de caixas, mas o respeito ao tempo do cliente. Não é o preço mais baixo, mas a sensação de que a escolha foi acertada. O novo consumidor está em busca de marcas e negócios que andem ao lado dele, que se conectem ao seu jeito de viver. Preço é importante? Foi, é e sempre será, mas a pergunta certa é: O preço é determinante? A resposta a essa pergunta é fundamental para a forma de você gerir seu negócio. Se for determinante, não precisa se preocupar com segurança, limpeza, atendimento ou qualidade. O preço é quem determina e o foco deve ser nele. Se a resposta for negativa, então o trabalho é triplicado, tem que manter um padrão mínimo e o foco na jornada do cliente.
O sofá e o smartphone continuarão sendo concorrentes duros. Mas o varejo físico tem uma arma que eles jamais terão: a experiência humana. Cabe a cada empresário decidir se vai usá-la ou continuar vendo seus clientes deslizarem o dedo na tela.
*Roberto James é um especialista em consumo e varejo, dedicado a desvendar as novas dinâmicas do mercado. Com uma visão provocadora, ele desafia empresas a abandonarem modelos antigos e a se adaptarem à mentalidade das novas gerações, transformando desafios em oportunidades de crescimento.

