20 nov, 2025
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Amazônia que empreende: Rota do Combu se fortalece como modelo de desenvolvimento local

Iniciativa do Sebrae reúne empreendedores locais, artesãos, instituições públicas e comunitárias para fortalecer turismo sustentável em Belém

Carlos Borges/Sebrae
Amazônia que empreende Rota do Combu se fortalece como modelo de desenvolvimento local

Na margem oposta de Belém, a poucos minutos de barco do centro da cidade, a Ilha do Combu vem se consolidando como um dos polos mais vibrantes de turismo comunitário da Região Norte. A Rota Turística do Combu, criada a partir de uma articulação conjunta entre o Sebrae, empreendedores locais e instituições parceiras, já se tornou referência em experiências amazônicas que conectam gastronomia, natureza, cultura e bioeconomia.

A proposta nasce de um princípio simples, mas poderoso: somente o trabalho coletivo e a organização comunitária conseguem transformar potencial turístico em impacto real para quem vive na Amazônia. Como explica Mariana Cavalcante, gestora nacional de Turismo do Sebrae e coordenadora do projeto, a rota surgiu justamente para fortalecer esse protagonismo. “A ideia era transformar esse território em um modelo vivo de turismo baseado na floresta em pé, mostrando ao turista o que a floresta nos dá quando a gente devolve cuidado para ela”, afirma.

Segundo ela, o objetivo sempre foi conectar experiências que já existiam e organizá-las de maneira coerente, sensível e com identidade própria. “Queríamos que o visitante tivesse uma imersão sensorial real. Para a comunidade, a rota trouxe autoestima, visibilidade e renda, reforçando a ideia de que eles são os guardiões desse território com alma.”

Turismo sustentável como motor de desenvolvimento local

A Rota do Combu foi estruturada para atender a um novo perfil de viajante, pessoas em busca de experiências autênticas, vivências culturais e contato direto com comunidades tradicionais, sem abrir mão da responsabilidade ambiental. A iniciativa reúne restaurantes, produtores de cacau, artesãos, guias, empreendedores da economia da floresta e famílias ribeirinhas que decidiram formalizar seus serviços e trabalhar de forma integrada.

Hoje, são 14 empreendimentos que expressam, cada um à sua maneira, a vida no território. “Cada um já oferecia vivências muito autênticas, como a trilha do açaí, as biojoias, o chocolate artesanal, a cultura ribeirinha. O Sebrae entrou para fortalecer esse ecossistema sem alterar o que tem de mais importante, que é o modo de vida”, explica Mariana.

Ela ainda ressalta que essa atuação passa por gestão, atendimento, sustentabilidade, precificação, comunicação e posicionamento no mercado, etapas essenciais para garantir renda contínua sem descaracterizar o cotidiano da ilha. “Nada foi inventado. Só potencializamos o que já existia. O turismo no Combú é uma extensão da vida ribeirinha, não uma interferência nela.”

O resultado é um circuito que une trilhas, igarapés, casas de chocolate artesanal, gastronomia regional e visitas a áreas preservadas de mata nativa — tudo amparado por princípios de turismo de base comunitária, distribuição de renda e conservação da floresta.

O que torna o Combu tão singular

O processo de estruturação da rota envolveu escuta ativa, identificação das vocações locais e qualificação dos empreendedores. A lógica é a de uma rota codificada coletivamente: cada integrante entende seu papel, a proposta conjunta e o impacto que a visitação tem na comunidade.

De acordo com a coordenadora do projeto, consolidar um produto coletivo na Amazônia exigiu governança forte desde o início. “A rota nasceu com desafios naturais, logística fluvial, infraestrutura limitada, presença digital tímida, mas fomos resolvendo ponto a ponto ao lado dos empreendedores”, destaca. Um passo decisivo foi trazer a certificação internacional da Green Destinations, que elevou o padrão da rota e garantiu reconhecimento logo no lançamento. Também houve investimento em narrativa, identidade visual, presença em feiras, famtours, presstrips e articulação com operadores nacionais e internacionais. “A rota não é só um conjunto de atividades, ela é uma jornada pelos sentidos”, resume.

O encantamento em torno da Rota do Combu não vem apenas da paisagem: vem do conjunto de experiências. O visitante pode sair de Belém, navegar por poucos minutos e, de repente, estar imerso em uma Amazônia que mistura tradição, gastronomia e empreendedorismo.

Para Mariana, o segredo está no fato de que a experiência tem alma. “A lição do Combu é que a experiência precisa contar uma história. É ativar sentidos, construir memória e reforçar a ideia de uma floresta viva, algo que só quem é da Amazônia consegue transmitir.”

Desafios e caminhos de crescimento

Apesar dos avanços, a rota ainda enfrenta desafios típicos de regiões ribeirinhas: logística de acesso, necessidade de sinalização turística, qualificação contínua e fortalecimento da governança. O deslocamento fluvial, parte fundamental da experiência, também exige planejamento, segurança e serviços de apoio que acompanhem o crescimento da demanda.

Mariana reconhece essas limitações, mas destaca que a rota já está preparada para amadurecer. “Alguns desafios dependem de políticas públicas e parceiros externos, mas deixamos um plano orientador para que os empreendedores saibam os próximos passos. A rota foi pensada para durar além da COP30.”

Não por menos, a Rota do Combu se consolidou como um case emblemático de como comunidades podem criar valor econômico sem abrir mão de sua identidade. Para além da visitação, o projeto se tornou um laboratório de novos modelos de serviço, mostrando como a cooperação entre empreendedores é capaz de impulsionar cadeias produtivas inteiras. “Quando empreendedores entendem que o sucesso de um fortalece o todo, as coisas começam a fluir de verdade”, afirma Mariana.

O futuro da Rota do Combu passa pela consolidação da governança comunitária e pela ampliação das atividades sem comprometer a essência da ilha. O grupo gestor já definiu critérios claros para a entrada de novos negócios, com crescimento condicionado ao respeito aos princípios da rota: floresta em primeiro lugar, sustentabilidade como prática e protagonismo da comunidade.

“A expansão é bem-vinda, desde que a floresta permita, que a comunidade queira e que tudo seja coerente com a essência da rota”, reforça a gestora nacional de Turismo do Sebrae. Ela destaca que a internacionalização já começou, com apoio da Embratur, e que operadoras estrangeiras têm visto o Combu como exemplo de turismo baseado em bioeconomia e cultura viva.

Entre as possibilidades de futuro estão novas trilhas, roteiros temáticos, experiências imersivas, atividades de educação ambiental e fortalecimento da rota do cacau, tudo guiado por uma visão clara: “Que o Combu se torne símbolo da Amazônia que empreende, que preserva e que inspira outros territórios a seguirem o mesmo caminho.”

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