15 fev, 2025
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“Mulheres podem assumir novos desafios mesmo sem estarem 100% preparadas”, diz Bia Galloni

Conselheira de administração e mentora fala sobre desafios da liderança feminina, vieses inconscientes e ações para promover diversidade nas empresas

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“Mulheres podem assumir novos desafios mesmo sem estarem 100% preparadas”, diz Bia Galloni

Bia Galloni, executiva com mais de 23 anos de experiência como C-Level em setores como bens de consumo, serviços financeiros e tecnologia, compartilha com o Seja Relevante sua visão sobre os desafios das mulheres na liderança corporativa. Conselheira certificada pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) e pela Board Academy, e membro de conselhos como o da Live University, Galloni já liderou áreas estratégicas em empresas como Unilever, Tetra Pak, Mastercard e Banco Safra, onde foi responsável pela criação do conceito “Quem Sabe Safra” e pela implementação da área de ESG.

Atualmente, Bia atua como conselheira, mentora e consultora, impulsionando transformações positivas nas organizações com foco em marketing, ESG e desenvolvimento de negócios. Com uma carreira marcada pela busca por equidade de gênero, ela explora nesta entrevista como as empresas podem romper barreiras, combater vieses inconscientes e criar ambientes mais inclusivos e diversos.

Na entrevista, Galloni também aborda como a colaboração entre homens e mulheres pode ser incentivada nas corporações, defendendo políticas como metas de contratação e promoção de mulheres, entrevistas às cegas e licenças parentais iguais para ambos os gêneros. Ela também destaca a relevância do ESG como motor para uma liderança mais inclusiva e aponta caminhos para superar as barreiras que ainda limitam o acesso das mulheres aos postos mais altos nas organizações.

Leia a entrevista na íntegra.

Quais são os principais desafios que as mulheres enfrentam ao buscar posições de liderança em ambientes corporativos?

Um dos maiores desafios é a dificuldade de serem ouvidas e reconhecidas no mesmo patamar que os homens. Há um viés inconsciente que leva muitos a verem as mulheres como assistentes, e não como líderes. Frequentemente, elas são interrompidas ou ignoradas em reuniões, enquanto homens que fazem análises semelhantes são aplaudidos. Além disso, para mulheres jovens, o maior desafio é a resistência à contratação ou promoção por serem ou poderem ser mães, o que é visto como um problema em termos de custos e ausência. Para mulheres negras, a situação é ainda mais complicada, pois enfrentam preconceitos adicionais.

Qual o papel que os homens devem desempenhar para apoiar as mulheres rumo à liderança?

Os homens devem escutar e dar espaço para as mulheres nas discussões e eventos corporativos, como reuniões e almoços de negócios. As mulheres precisam participar dessas oportunidades de networking, mesmo tendo filhos as esperando em casa.

Como essa colaboração pode ser incentivada nas empresas?

As empresas devem liderar pelo exemplo, com o CEO reconhecendo e valorizando as opiniões das mulheres. A área de RH deve promover treinamentos para identificar e corrigir vieses inconscientes e criar oportunidades para o desenvolvimento feminino. Também é importante definir metas de contratação e promoção de mulheres, adotar entrevistas às cegas e oferecer licença parental igual para ambos os sexos.

E como esses vieses afetam a percepção e as oportunidades para mulheres em posições de liderança?

Os vieses inconscientes são um dos maiores obstáculos, levando as mulheres a enfrentarem o “teto de vidro” que limita o acesso aos cargos mais altos. Esses vieses influenciam avaliações de desempenho, onde mulheres educadas são vistas como frágeis e as assertivas como rudes. Há muito conteúdo relevante sobre o tema, como o artigo “How to Close the Gender Gap”, da Harvard Business Review, e o livro “Quebre o Teto de Vidro”, de Karina Forlenza.

Você menciona que ter apenas uma mulher em um conselho de administração não resolve a questão da diversidade de gênero. Quais são os benefícios de uma maior representação feminina nos conselhos?

Com uma única mulher em uma sala de reunião ou conselho, ela não é ouvida. Mas, conforme aumenta a proporção de mulheres, as discussões se tornam mais ricas e equilibradas, pois diferentes pontos de vista são ouvidos e respeitados. Já está provado que a diversidade traz ganhos mensuráveis de lucratividade e resultados.

Quais foram os momentos-chave que moldaram sua visão sobre liderança feminina?

Quando era gerente de produtos de uma multinacional, eu não conseguia ser ouvida nas reuniões com a área comercial, onde a maioria era de homens. Percebi que precisava falar a língua deles e, então, migrei para vendas. Consegui, mas meu caminho foi mais longo e difícil do que teria sido para um homem. Tornei-me a primeira gerente “key-account” de grandes contas. Mais tarde, assumi a diretoria de ESG de um banco familiar, um tema que eu não dominava, e fui aprender do zero, mostrando que mulheres podem assumir novos desafios mesmo sem estar 100% preparadas.

Como você vê a importância da mentoria e do apoio entre mulheres no ambiente corporativo?

Mentoria e coaching são importantes, mas não suficientes. Mulheres precisam participar também do networking masculino. Os homens contratam homens porque são aqueles com quem eles têm contato. É o velho ditado: “quem não é visto, não é lembrado”.

De que maneira a agenda de ESG (Ambiental, Social e Governança) pode ser uma aliada na promoção da liderança feminina?

ESG é um tema relevante nas discussões de liderança, e todos, mulheres e homens, devem estar preparados para abordá-lo. Em um cargo de diretoria ou gerência, é fundamental discutir temas de ESG com profundidade, para evitar riscos, diminuir os impactos da organização e proteger a reputação.

Olhando para o futuro, quais são suas esperanças para a liderança feminina? Que mudanças gostaria de ver nas organizações para promover inclusão e equidade de gênero?

Mudanças significativas só virão com as novas gerações, que já estão sendo criadas em um ambiente de menos preconceito de raça e gênero. Homens mais velhos na liderança das organizações ainda têm dificuldades em mudar seus vieses inconscientes. Mas, com iniciativas como “Pratique ou Explique”, da B3, estamos avançando. A cada passo, evoluímos. Precisamos de mais ações assim para continuar progredindo.