Relação China-Brasil envolve desafios e oportunidades
Especialistas alertam que relação entre os dois países tem boas expectativas no momento atual
ShutterstockO anúncio de investimentos de empresas chinesas no Brasil deixou de ser frequente como era há alguns anos, mas isso não significa o enfraquecimento da relação entre os dois países. A mudança decorre de novos mecanismos de controle de capital implementados pelos chineses em anos recentes, o que torna mais complexo o envio de dólares para o exterior. Uma das oportunidades, inclusive, é a possibilidade de empréstimos chineses para projetos de infraestrutura, mostrando que a relação China-Brasil é dinâmica.
Esse foi um dos pontos do seminário global Leadership in the New Geopolitical Order: China and Brazil, que reuniu os professores Rodrigo Zeidan, da New York University Shanghai e da Fundação Dom Cabral (FDC), e Patricio Giusto, da Universidad de la Defensa Nacional (UNDEF) e da Universidad Nacional de La Plata.
Zeidan, que está baseado em Xangai, lembrou que as reservas chinesas, que já chegaram a US$ 4 trilhões, hoje se estabilizaram por volta de US$ 3 trilhões, sendo que boa parte da diferença está nos investimentos feitos no exterior por companhias chinesas. Hoje, . A maior parte deles envolve o fornecimento de insumos fabricados naquele país.
Exemplos da relação China-Brasil
De acordo com Zeidan, eventos recentes, como o investimento da BYD no país, precisaram de autorização do governo chinês para o envio de capital, diferentemente de outras épocas. As restrições explicariam a menor participação não só na América Latina, como a desaceleração em outras regiões, como na Europa, onde os chineses compraram participação em empresas como Pirelli e Volvo.
O especialista destacou ainda que a China é o maior parceiro de negócios do Brasil, sendo que nós somos um dos poucos países no mundo com superávit na balança comercial. Para ele, a China tem sido subestimada a curto prazo e superestimada a longo prazo.
Zeidan explica seu ponto de vista com dados, caso da produtividade do trabalhador chinês, que seria 20% do seu contraponto nos Estados Unidos. Segundo o pesquisador, é improvável que a China continue crescendo, na próxima década, nos mesmos níveis do passado.
Outro exemplo para ilustrar o ponto de vista do professor brasileiro é o consumo de minério de ferro: o país sozinho compra 70% da produção mundial dessa commodity, sendo a maior parte dele importado do Brasil, o que reforça a importância do relacionamento entre as duas nações. Zeidan aposta que a neutralidade brasileira é um ativo importante no futuro, principalmente se a relação dos chineses com os Estados Unidos escalar mais em relação a um tema complexo, que envolve Taiwan.
Assim como ele, o argentino Patricio Giusto, que é diretor executivo do Observatório Sino-Argentino e especialista na China, acredita que o conflito regional, envolvendo a ilha citada, pode evoluir. O assunto, que não estava mapeado como prioridade por outros governos, pode ter entrado em uma nova fase para as gerações atuais.
Geopolítica na relação China-Brasil
Na lista de temas geopolíticos importantes que podem pautar a relação China-Brasil, o especialista argentino destacou que o ano de 2024 deve ser complexo em função da expansão mundial de conflitos, com reflexo na economia e déficit de lideranças mundiais significativas. Ele também chama a atenção para problemas econômicos estruturais entre os chineses, incluindo o envelhecimento da população, o decréscimo da produção fabril e do consumo doméstico.
O Brasil, como grande produtor de alimentos e de matérias primas como minério de ferro, continua sendo um parceiro preferencial da China, de acordo com ele. Giusto, assim como Zeidan, vê oportunidades em áreas como infraestrutura e energia verde, além da possibilidade de investimentos em base tecnológica. Nesse último caso, o Brasil pode aproveitar melhor essa janela do que seus vizinhos na América Latina, até pela pujança da economia e mão de obra qualificada em áreas técnicas.
O aprofundamento da relação também acontece com a mudança de governo, sendo que a gestão atual de Lula mantém um relacionamento mais pragmático do que ideológico com a China. O chamado fator Milei – de afastamento da Argentina – é outro ponto que pode aproximar ainda mais os chineses do Brasil.
Para Zeidan, a China está mais agressiva em termos de competitividade. Internamente, o país oriental enfrenta o desafio de estar num cenário de Middle Income Trap, ou seja, da passagem para uma economia de maior renda – ou não. Ele vê dois caminhos: ou o país ficará estagnado nesse quadro ou evoluirá para um modelo similar ao da Coreia do Sul.
Giusto, por sua vez, vê oportunidades de o Brasil aproveitar o crescimento da China, e também se posicionar melhor no mundo via parcerias, como a dos BRICs, com participação ativa em grupos como o G20.