06 out, 2025
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Agronegócio tem um papel estratégico para conter as mudanças climáticas

A elevação da temperatura média global, a frequência crescente de eventos extremos e a redução da previsibilidade climática impactam diretamente a produtividade de culturas sensíveis

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Agronegócio tem um papel estratégico para conter as mudanças climáticas

A intensificação da crise climática impõe ao agronegócio brasileiro desafios estruturais e oportunidades estratégicas que requerem uma mudança no paradigma da produção agropecuária tradicional. A elevação da temperatura média global, a frequência crescente de eventos extremos e a redução da previsibilidade climática impactam diretamente a produtividade de culturas sensíveis, a estabilidade dos ciclos produtivos e a disponibilidade hídrica, elementos centrais para a sustentabilidade das cadeias agroalimentares.

O setor agropecuário, responsável por aproximadamente 23% do PIB brasileiro e por mais de 28 milhões de empregos, encontra-se hoje no centro do debate climático global. O segmento é o principal responsável pelas emissões de gases de efeito estufa (GEE) no Brasil, ao mesmo tempo em que é vulnerável às mudanças do clima, embora também possa ser um agente relevante para sua mitigação e adaptação. Essa ambivalência atribui ao agronegócio um papel estratégico na COP30, que será sediada no Brasil, em um contexto geopolítico em que a Amazônia se projeta como símbolo da inflexão ambiental necessária para evitar o colapso climático.

O enfrentamento dos riscos climáticos exige, por parte do setor, a internalização de práticas regenerativas e a incorporação de tecnologias que favoreçam a eficiência de recursos. Estratégias como integração lavoura-pecuária-floresta, sistemas agroflorestais, recuperação de pastagens degradadas e manejo hídrico são apontadas como mecanismos-chave para a resiliência e a competitividade sustentável. Evidências reunidas pelo IPCC e pelo Emissions Gap Report da UNEP reforçam que soluções baseadas na natureza oferecem uma relação custo-efetividade superior frente a alternativas convencionais.

Desenvolvimento em gestão, liderança e inovação aplicados ao agronegócio

Além dos desafios ambientais, o agronegócio enfrenta crescentes pressões de mercado, reputação e regulação. Certificações aplicadas às cadeias produtivas têm sido cada vez mais exigidas. A entrada em vigor de normativas como o European Union Deforestation Regulation (EUDR), no final de 2025, devem impor barreiras comerciais aos produtos oriundos de áreas com desmatamento, exigindo rastreabilidade georreferenciada e conformidade com legislações socioambientais. A normativa tem como foco culturas como a soja, cacau, café, carne bovina, madeira, borracha e óleo de palma. Parte dessas commodities são extensamente produzidas no território brasileiro.

Neste cenário, destacam-se os incentivos à transição, como as linhas de crédito do Plano ABC+ e o programa RenovAgro, que fomentam práticas de baixo carbono com benefícios financeiros. Paralelamente, a pressão de investidores institucionais e consumidores globais vem redirecionando capital para empresas alinhadas a padrões ESG, ampliando o peso da sustentabilidade como ativo reputacional e mercadológico.

O debate em torno da participação do agronegócio na COP30 converge para um consenso: tornar as cadeias produtivas mais sustentáveis não se trata apenas de uma resposta à emergência climática, mas de uma condição para o acesso a mercados, atração de investimentos e preservação da competitividade. A agricultura regenerativa, a valorização de serviços ecossistêmicos e o engajamento em modelos de produção de baixo carbono consolidam-se como vetores indispensáveis para reposicionar o agro brasileiro como parte da solução, e não como parte do problema, no contexto das negociações climáticas internacionais.

* Daiane Neutzling é professora da Fundação Dom Cabral e
pesquisadora nas áreas de Gestão de Cadeias de Suprimentos Sustentáveis e Empreendedorismo Social.

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